dezembro 16, 2009

** Calçada **

As unhas dos pés estavam compridas demais, chegava a machucar dentro do tênis. O tênis estava apertado demais, e de tão velho já mostrava seus dois furos novos. As calças exibiam um jeans gasto, com uns quatro ou cinco buracos desfiados (propositalmente, para disfarçar a velhice da peça), a camiseta tinha a gola torta e frouxa; tinha uma ou duas manchas de gordura, mas estava limpa apesar de cheirar sabão em pedra. Os cabelos eram oleoso, caíam no seu rosto tampando seu olho direito, dando um ar de deboche e descuido, tinha caspa, coçava muito e só via água 1 vez por semana. Sua mão exibia uma cor escura, não pelo tipo de pele, mas por estar encardida; entre as unhas uma sujeira penetrante, preta, marrom, uma sujeira que exibia diversas cores… cores de uma cidade que se misturava ao caos, a agitação e a loucura dia a pós dia.
Aquele lug
ar na calçada era o seu preferido, quase ninguém pisava no seu pé dolorido ali, era espaçosa e as vezes podia esticar as pernas. Daquele lugar podia divisar as mais diferentes imagens…. conseguia ver o alto do edifício á sua frente e sentir-se dentro dele, em um confortável sofá, vendo um programa de tv, comendo um sanduíche e tendo um banheiro limpo e com chuveiro quente para tomar seu banho; e depois de banhado descia pelo elegante elevador social esbanjando sua roupa nova e seu perfume importado que com duas gotas fazia qualquer um virar-se. Também podia ver os carros que por ali passavam, um mais veloz que o outro, e de cores diferentes, e modelos e performances… e também era capaz de se ver lavando seu carro em um domingo quente, ouvindo seu som preferido, conversando com os amigos na calçada sobre a festinha de ontem.
Ali ele ta
mbém podia ver diferentes pessoas, diferentes roupas, diferentes estilos… e também podia se ver indo de volta para casa, chegando cansado e feliz por mais um dia de serviço, jogando sua mochila no sofá, tirando o tênis e deixando no meio da sala, deitando no sofá e esticando as pernas para descansar. E logo em seguida sua mãe chamando para jantar, mas antes disso ele tinha que tomar um banho , pois as ruas e transportes públicos eram sujos e transmissores de doenças.
Tudo isso ele era capaz de ver, de sentir, mas incapaz de fazer. AS ruas sujas e transmissoras de doenças eram agora sua moradia, seu confortável sofá era o degrau daquela calçada que agora estava sentado a refletir. O banho ele poderia tomar naquele dia mesmo, se tivesse sorte e começasse a chover, sua refeição era garantida pelo dono de um bar-restaurante que deixava as sobras para o cachorro (que ainda nã
o sabia que era ele). Sim, ele apenas sobrevivia, na selva de concreto e arranha céus, na mata de luxuria e avareza, no pântano de desfavorável condição e classe social.
Não, ele não queria um tênis caro, nem uma camiseta que gritasse sua marca estampada para todos lerem, e nem um carro de luxo. Talvez ele quisesse uma oportunidade para tentar vencer, uma chance para tentar realizar, uma brecha para conquistar. No entanto, seu aconchego continuava sendo a calçada, seu refúgio continuava sendo seus sonhos e sua esperança continuava sendo a certeza de que amanhã s
eria um outro dia, e novamente o Sol estaria brilhando lindo e confortável, sob o céu de uma cidade cinza e sem nuvens. E então a noite caiu, mas não havia estrelas, e nem havia vento, somente uma brisa calma e refrescante, deixando a sensação de que por mais miserável que era sua vida, ele tinha uma, e não cabia a ele desmerecê-la, mas sim tentar mudá-la a fim de que ela fosse melhor.

5 comentários:

  1. lindo e triste... a realidade de milhoes de pessoas.

    Da tristeza ver tantos futeis e egoistas que nada ajudam, só sugam as pessoas e ainda reclamam sempre de tudo. Os ricos mais pobres que podem existir.

    Mas ainda existem muitas pessoas ricas sem tanto dinheiro que muito ajudam :D

    Beijos, adorei também! seguindo :)

    www.diarioastral.com

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  2. Sentar e esperar um outro dia melhor, é o que todos nós sempre fazemos, sendo ou não um garoto de rua, mendigo...esta aí o grande erro de toda a humanidade em geral: não tentar !

    Gostei bastante do texto...bastante descritivo...você escreve beem..

    bjs

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  3. acredito que para muitos so falta oportunidades e q todos tem potecial p vencer na vida

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  4. bruna me aceita no seu blof, naum consegui entrar .. beijos

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